A relação com a nossa roupa - Colete UNO

O colete UNO é mais uma peça única que criei, feito com aproveitamento de fios que tinha cá por casa. Inicialmente pensei num casaco, mas como já não tinha fio suficiente para as mangas e o objetivo era utilizar os fios disponíveis e não comprar mais, ficou um colete!

Por consequência da comemoração da Fashion Revolution Week tenho andado a refletir de uma maneira mais consciente e profunda sobre a nossa relação com a roupa e no impacto que isso pode ter na nossa vida e inclusivé na vida do planeta. E certamente tem impacto no meu trabalho e no meu processo de criação.

Gostar da minha roupa, estimar a roupa até ao último dia, cuidar dela a cada lavagem, a forma como a guardo, como a uso, tem que ver com a minha relação com a roupa. E não é um cliché. Não é uma coisa superficial. É sobre amor, sobre respeito por quem fez cada peça de roupa que tenho. É sobre a minha responsabilidade sobre essas peças. É sobre o seu valor. Tal como nós todos temos a nossa pegada ecológica no planeta, assim cada peça de roupa produzida também a tem. Todos os produtos a têm, na verdade. E há que produzir com esta consciência. Não podemos continuar a perpetuar um consumo desenfreado ao qual assistimos nos últimos anos. Eu sei que é assim o mundo em que vivemos, capitalista, em que o ato de consumir é um objetivo que alimenta este sistema. Mas, está claro que algo terá de mudar e não é a longo prazo, é agora!


Cresci a ouvir a minha mãe dizer-me que sou muito apegada às coisas. E porquê é que ela me dizia isto? Porque de facto, eu sempre estimei as “minhas” coisas, as minhas roupas, os meus livros, o meu espaço. Sempre cuidei com carinho. Guardava tudo! Transformava muita roupa minha, quando não podia comprar roupa nova mas desejava andar “na moda”. Fazia e criava malas e bolsas cosidas à mão, e mais tarde, fui rebuscar as lãs perdidas e a “envelhecer” no armário no hall da casa.

Atualmente tenho peças de roupa compradas em segunda mão. Tenho peças de roupa que eram da minha mãe e que foram feitas à mão. Tenho peças que fiz para mim. Tenho peças que me foram oferecidas. Tenho peças que comprei em lojas de #fastfashion mas que têm anos! E gosto de cada uma delas. Tenho memórias de momentos e experiências em que usei determinadas peças. A cada peça de roupa adiciono memórias. E isto, estes momentos, esta memória que fica apegada a uma peça, faz com que ganhe ainda mais valor. Não é só o valor da pessoa que fez a peça, o valor da matéria prima e valor de todo o caminho que a peça tem até chegar a nós. É também o valor que lhe acrescentamos por meio das nossas experiências de vida.

E esta frase “sou muito apegada às coisas” andou sempre comigo. Mas hoje percebo que era o meu amor pelas coisas, porque me envolvi emocionalmente com elas. Muito longe da superficialidade!

Por isso, quando faço uma peça de roupa, principalmente, por pedido personalizado, é sempre algo muito especial. A peça que eu crio vai integrar a vida de alguém. A peça que eu faço, fruto da minha imaginação e conhecimento, de vivências dos intensos dias de criação, do entrelaçar dos fios que outro alguém também já fez, conta o início de uma história. E essa peça, quando chegada ao seu destino final, vai continuar ou contar novas histórias e memórias da pessoa que comprou a peça.  


E perguntas tu, o que tem isto a ver com a nova peça que criei? Tudo. Por ser uma peça única, não haverá outra igual. A pessoa que comprar esta peça saberá várias coisas, saberá que fui quem fez a peça, que dediquei o meu tempo a fazer, que o valor da peça é maior, que é uma peça pronta para começar uma nova história. E muito certamente irá cuidar dela com mais carinho e fazer assim com que também dure muito mais tempo.